O economista Osiris Silva e o pesquisador Philip Fearnside divergem sobre a efetividade das medidas de proteção ambiental previstas no projeto de repavimentação da BR-319, estrada federal que liga Manaus a Porto Velho. No próximo dia 29, em Brasília, o grupo de trabalho criado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para estudar a viabilidade da rodovia apresentará, no Ministério dos Transportes, um estudo contendo um cronograma de medidas para destravar a obra.
Osiris Silva afirma que o governo federal deve agir com “coragem e consciência” para tornar a BR-319 uma das linhas da defesa da riquezas e da integridade geopolítica da região amazônica e citou um acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU) sobre desastres relacionados a eventos climáticos extremos, como um dos motivos para manter a via ativa.
“Projeta-se que a tendência dos crescentes desastres relacionados ao clima aumente 40% até 2050. Isso resultará em 1,5 desastre de média a grande escala por dia em algum lugar no mundo, caso não tomemos ações suficientes para redução dos riscos. Não se pode debitar ao pleno funcionamento de uma rodovia vital para a economia da Amazônia Ocidental possíveis danos ambientais insanáveis para o Brasil e o mundo”, defendeu o economista e estudioso da Amazônia.
Custo ambiental
Para o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) e Doutor pelo Departamento de Ecologia e Biologia Evolucionária da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, Philip Fearnside, a BR-319 não vai ser ambientalmente sustentável.
“Tem que ser bem claro sobre isto. As medidas a serem adotadas apenas amenizariam um pouquinho do impacto ao longo da rota entre Manaus e Humaitá, enquanto os impactos muito maiores afetariam vastas áreas longe da estrada em si e não seriam controlados, mesmo se o presidente da república e os governadores estaduais tivessem isto como prioridade”, explicou.
Segundo Fearnside, esses impactos não foram considerados no Estudo de Impacto Ambienta (EIA) e não fazem parte das discussões atuais organizadas pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT). Ainda segundo o especialista, a BR-319 deve trazer grileiros, fazendeiros, agricultores e madeireiros da região “Amacro”, uma área de desmatamento nas fronteiras da Amazônia, Acre e Rondônia, também conhecida como a Fronteira do Desmatamento.
Barreira verde
De acordo com projeto de reconstrução estavam previstas várias medidas ambientais, como a criação de reservas ao longo do trajeto. Para Osirís Silva, a BR-31 é amplamente protegida por uma verdadeira “barreira verde” interposta pelos governos federal e do Amazonas através de Unidades de Conservação (UCs) situadas ao longo de toda da extensão de 875 km no interflúvio Purus-Madeira.
“De acordo com normas do Ministério do Meio Ambiente (MMA), as UCs visam oferecer garantias segundo os princípios de ordenamento territorial e conservação ambiental em relação ao Sul do Amazonas, abrangendo os municípios de Canutama, Humaitá, Lábrea e Manicoré, e de Porto Velho, capital de Rondônia. No total, são 28 unidades, sendo 11 federais, 9 do Amazonas e 8 de Rondônia, suficientes para assegurar a proteção do bioma em toda sua extensão”, explicou.
De acordo com o economista, o Amazonas já atua em conformidade com a Lei nº 9.985/2000, que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC) e estabelece critérios e normas para a criação, implantação e gestão dessas Unidades.
“Ela já criou seis UCs espalhados pelo bioma da BR-319, plenamente protegidas que totalizam 2.320.667,31 hectares. Portanto, não é por falta de medidas protetoras que a recuperação da BR-319 continue sendo considerada como ameaça à degradação ambiental do bioma. Impensável é Amazonas e Roraima continuarem dependentes apenas do modal fluvial para o transporte de cargas e passageiros, ora gravemente afetado pela forte estiagem que, por cerca de 120 dias, produziu incalculáveis prejuízos e males à economia e ao povo amazonense e roraimense por tal imprevidência”, afirmou.
*Fonte: Acrítica