Musical / Fantasia
Roteiro: Winnie Holzman e Dana Fox
Direção: Jon M. Chu
Com Cynthia Erivo, Ariana Grande, Michelle Yeoh e Jeff Goldblum
EUA, 2024
Vídeo:
Glinda, a Bruxa Boa do Oeste anuncia ter livrado a Terra de Oz de Elphaba, a Bruxa Má do Sul. Mas os contos de fada da Disney não são mais os mesmos.
Acaba de chegar aos cinemas, Wicked, filme que se passa no mesmo universo de O Mágico de Oz, o clássico musical de 1939, protagonizado por Judy Garland. Esse texto não vai ter spoiler, mas como você vai perceber, o filme dá alguns spoilers de si mesmo. Até porque é uma história que se passa antes dos acontecimentos de O Mágico de Oz.
Wicked é adaptado de um musical da Broadway de 2003 que fez muito sucesso. O musical, por sua vez, foi adaptado de um livro, assim como o filme original. O novo filme é bem fiel ao musical, as músicas são muito boas, grandiosas. O que confere ao filme um caráter também grandioso, e com um final apoteótico, típico dos contos de fada. Mas é preciso lembrar que esse filme, com 2 horas e 40 minutos, é apenas a primeira metade da história. Está previsto para novembro de 2025 o lançamento da segunda parte nos cinemas. Mas será que há material suficiente para mais 2 horas e meia de filme. Bem, o que eu posso dizer é que a primeira parte funciona muito bem!
PRIMEIRO ATO
Antes de aparecer qualquer imagem, cartelas anunciam que a bruxa má foi derrotada e que houve uma época em que os animais falavam em Oz. Um exemplo de como o filme faz spoiler de si mesmo. A câmera nos leva até o mundo Mágico de Oz e dá até para ver Dorothy e os seus amigos caminhando pela estrada de tijolos amarelos.
Então aparece Glinda, a Bruxa boa do sul, coprotagonista do filme. Que fala mais uma vez para os Chipmunks, um dos povos que habita o Mundo Mágico de Oz, que o mundo está livre da Bruxa má do Oeste. É interessante notar que Glinda está usando o truque da levitação. Sugiro que você guarde essa informação para quando assistir o filme e preste atenção bem lá no final, na última sequência.
Os Chipmunks comemoram efusivamente a morte da bruxa e começamos a desconfiar que algo está errado. Hoje em dia, é estranho um filme da Disney mostrar pessoas comemorando uma morte. A Disney tem evitado o maniqueísmo de antigamente e apostado em retratar o empoderamento feminino, tanto que as principais personagens são mulheres!
Alguém pergunta para Glinda, se é verdade que ela era amiga de Elphaba. A Bruxa Boa fica sem jeito, mas começa a contar a história da Bruxa Má. Portanto o filme é um grande flashback.
O roteiro não demora a mostrar que a Elphaba não é nem mesmo uma vilã. Aliás, ela é até mais protagonista do que a Glinda. E vai fazer isso contando a sua origem, um recurso conhecido de roteiro para humanizar personagens. Elphaba foi o fruto de um caso extraconjugal de sua mãe. Nasceu verde e foi renegada pelo pai. Dessa forma as roteiristas aplicam outro recurso bem tradicional, gerando empatia pela protagonista por meio do sofrimento.
Ao mostrar a infância de Elphaba, é introduzido um tema importante para o filme e para os dias de hoje: o preconceito, que acontece acima de tudo com quem é diferente. O roteiro deixa tudo muito escancarado, para não deixar dúvidas. Afinal o filme também se dirige a um público infanto-juvenil. E a diferença é evidente, na cor da pele da personagem. O preconceito geralmente é dirigido a uma minoria: de raça, classe social, origem, identidade de gênero, etc. Mas nesse caso não é nem uma minoria, porque Elphaba é a única pessoa que tem a pele verde. Dessa forma o roteiro nos faz sentir empatia por Elphaba e ficar com raiva de Glinda, ao contrário dos chipmunks. Assim o filme começa a apresentar aquela profundidade típica dos novos contos de fada.
INCIDENTE INCITANTE
Se o filme tem duas protagonistas o Incidente Incitante vai se dar quando as duas se conhecem, o que acontece na Universidade de Shiz. E nesse momento é introduzida uma personagem aliada. Madame Morrible é aliada de Elphaba, demonstrando que a personagem é mais protagonista que Glinda. Nesse momento, a Glinda é antagonista da Elphaba, e vice-versa. Ambas se odeiam com todas as forças.
E mais do que aliada, a Madame Morrible é uma típica Mentora, que enxerga o potencial de Elphaba e vai ajudar a protagonista a desenvolver e controlar os seus poderes para usá-los da melhor forma possível. Vamos notar que Morrible diz que Glinda não tem nenhum potencial para ser bruxa. Porém ela aparece levitando no começo do filme. Como isso aconteceu? É uma pergunta que deve ser respondida na continuação.
SEGUNDO ATO
Começa o segundo ato e o roteiro coloca mais motivos para termos empatia pela Elphaba. Ela é sempre atenciosa com Nessarose, sua irmã que vive numa cadeira de rodas. Também gosta dos animais, como o bode professor Dillamond. O último professor animal da universidade. Que tem a voz do Peter Dinklage, o anão de Game of Thrones.
Temos mais um comentário sobre preconceito, que vai gerar uma trama secundária do filme. Mais para frente alguém vai dizer que inventar um inimigo comum é a melhor forma de unir um povo. E nesse caso o inimigo escolhido foram os animais. Isso não é novidade, pois os inimigos sempre são os “diferentes”. E infelizmente, temos vários exemplos ao longo da história: para Hitler, os inimigos eram os Judeus, para o Trump são os imigrantes.
Com o tempo começamos a gostar de Glinda. Nos acostumamos com a atuação caricata e engraçada de Ariana Grande. Além disso, como foi adiantado no começo do filme, ela fica amiga de Elphaba. Portanto, de antagonistas, as duas personagens passam a ser aliadas.
Fica a pergunta de como e quando Elphaba vai “passar para o lado negro da força”. Como prometido, não darei spoilers. Posso apenas adiantar que o terceiro ato nos reserva grandes surpresas e reviravoltas.
Como a maioria dos contos de fada, aqui também temos um príncipe, porém o personagem não tem muita importância. Parece que só está ali porque um conto de fadas tem que ter um príncipe. Mas o que importa mesmo no filme são mulheres. E dessa forma a Disney segue se ressignificando, refletindo sobre o papel de homens e mulheres na atualidade e prestando um ótimo serviço às novas gerações.